sábado, 29 de dezembro de 2012

Cansado de inventar vidas
como um ator que nunca morre
e quanto mais o tempo lhe agoniza
muito melhor o personagem

cansado de derramar sonhos
como cachoeira que nunca seca
e quanto mais a água lhe inflama
menos pedras lhe seguram

cansado de crer e descrer
no humano, na paz, no afeto
como quem nasce e renasce

liberto de tantas mortes.
Eu queria ser desses
que nunca aprendem
a quem a vida
não consegue ensinar

queria ser como
os que gozam e não sentem
como os que partem
sem nenhum anseio de voltar

mas estou do lado de cá
onde a visão encurta as distâncias
e ofusca a imensidão
aqui de onde partem
múltiplos caminhos

e um poema
é quase sempre
a única saída.
Nas bases estreitas da escuridão
castelos mágicos e
naúfragos inexplicáveis
trafegam tormentas
despencam vestígios
celebram nefastidões

nas bases infindas da imensidão
sonhares místicos e
mistérios inigualáveis
derramam oceanos
intentam desertos
confessam ingratidões.
Pensar na vida
como um jazz
onde a próxima nota
é sempre imprevisível
mesmo desafiando
a harmonia das coisas
o som surge sempre
e o silêncio evidencia
o ritmo encantado
de um coração que sonha
sobre todas as coisas

A pesar de tantas mortes
pensar na vida
como um jazz
e dançar
ao sabor das horas
como se jamais
houvesse um fim
como se jamais
houvesse um início
Depois, bem depois
que todos os pássaros pararem de cantar
e o vôo seja apenas mera memória
quando a luz não mais iluminar
o humano desaparecido da história


depois, bem depois
das guerras infames em nome do poder
desastres intergalácticos por toda parte
quando a vida às vésperas de derreter
e negada nas constantes viagens a marte


depois, bem depois
da atmosfera imposta pelas horas
de toda e qualquer coisa em suspenso
quando esses versos forem sobras
de um plano emocional intenso

ainda assim será possível comprovar a existência
de um sentimento de proporções incomensuráveis.
Rasgar o verso no papel
como quem rasga o peito
com a força que a vida exige
para fazer o sonho acontecer

Tecer palavra a palavra
como quem tece com os dias
a malha mágica que a vida exige
para fazer a poesia reviver

Forjar grão a grão
ao longo do tempo castelos de areia
que a água da vida exige
para fazer a gente se refazer.
O que fazes de torpe
não mata, só fere
o que proclamas em vão
nas amarras exatas do irreal
não mata, só fere
esse derramar
de vaidades insanas
semente da agonia vindoura
não mata, só fere
esse desejo incontido
de tudo controlar
com único sentido de nada
não mata, só fere
bem como o esforço
para acertar, por certo
incerto e efêmero
não mata, só fere
mesmo quando tua boa
disserta verdades de pedra
teu corpo desmente

e tudo isso
não mata, só fere
Depois do fim do mundo
o fim do ano eclode
reflexivo
insensato
quase inesperado
no fim da tarde
nas últimas horas
no fim do sonho
as célebres senhoras
guardiãs de tudo
e eu
farto de tanto fim
de tanto refazer o verso
no verso do papel
espero tão somente a paz
planejada para outras vidas
as outras tantas incessantes
porque o fim já começou
e ele nunca finda.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Todo dia
enfrentar a batalha
e recomeçar
a procura singular
no âmago dos porquês

Como  qualquer humano
ressignificar
mesmo que reticente
mesmo que inconsciente
a mola que move
o todo do existir

E a rima inexata
que se faz do transbordar
o maior de todos
os mistérios.